Contra o extermínio da juventude pobre: nunca esquecer dos 11 da Grande Messejana

Na última quarta-feira, 31, a Justiça acatou o pedido de prisão feito pelo Ministério Público estadual em desfavor de 44 policiais militares indiciados como autores de 11 mortes ocorridas na madrugada do dia 12 de novembro de 2015 em três bairros da periferia de Fortaleza — na conhecida Chacina da Grande Messejana. Nove das onze vítimas tinham menos de 20 anos.

O Ministério Público, um dia depois, apresentaria, em entrevista coletiva, detalhes da barbárie. Para vingar a morte do policial Valterberg Chaves Serpa, morto em um assalto horas antes, os policiais fizeram um cerco na região que abrange bairros como Messejana, Curió, Barroso e Lagoa Redonda. Ainda segundo as apurações da Controladoria Geral de Disciplina, sem conseguir encontrar o latrocida que vitimou o soldado Serpa, os policiais passaram a matar quem estivesse nas ruas e pudesse assemelhar-se a um bandido. Na denúncia consta que Renayson Girão da SIlva, de 17 anos, voltava para casa em um ônibus quando homens encapuzados subiram no coletivo e o mataram. A tatuagem que tinha foi a prova cabal para a pena de morte. Assim como morar em um bairro tratado como zona de guerra por aqueles que deviam servir e proteger.

O sociólogo Luiz Fábio Silva Paiva, do Laboratório de Estudos da Violência da UFC (LEV\UFC), lembrou, no I Ciclo de Debates sobre Violência, Exclusão Social e Subjetivação, de um comentário que viu em uma notícia sobre a chacina. A comentarista perguntava, retoricamente, o que aquelas vítimas de homicídios estavam fazendo àquela hora no meio da rua. O sociólogo provocou: “será que se onze pessoas fossem mortas aqui [na UFC] ou em uma boate próximo ao Dragão do Mar fariam essa pergunta. Será que as mães dessas vítimas teriam que vir a público explicar que seus filhos não eram bandidos?”

A mãe de Pedro Alcântara Barroso, de 18 anos, em entrevista para o Profissão Repórter de abril deste ano, afirmava estar em uma “batalha” para provar que o filho era inocente — logo ele, assassinado após ser posto de joelhos, enquanto estava na calçada de uma rua que oferecia internet wi-fi. A mãe falava isso segurando prints de páginas da internet em que fotos do cadáver de Pedro não só eram exibidos, como tinham como legenda a acusação de que ele era o autor da morte do soldado Serpa. Até hoje, mesmo com os policiais sendo réus, multiplicam-se, sobretudo nos comentários de portais de notícia, as acusações. Morar em bairro pobre, ser jovem, ostentar uma cultura própria — pirangueira diriam alguns — é a condenação desses e de outros muitos jovens. Pele negra, cabelo montado, vestuário popular, ouvinte de funk ou rap. E criminoso não é gente. “Menos dois para dar trabalho para a Polícia”, como disse um dos policiais que se omitiram do dever de parar a matança, sobre o cadáver de duas das vítimas, que se salvaram pelo socorro de outros. Outra das vítimas da chacina, torturada, mas não morta, foi alvo por ter pulado o muro de uma clínica em que se tratava da dependência química. Além das 11 mortes, foram três tentativas de homicídio à bala e quatro torturas — três físicas e uma psicológica.

Mas não podem ser considerados responsáveis pela chacina só quem puxou o gatilho e prevaricou do serviço policial naquele dia 12. Se assassinos consideraram razoável atirar em jovens por parecerem “bandidos” é porque construíram imagens de “bandidos”, através de variados discursos referendados pelo senso comum em um processo retroalimentador. A causa da criminalidade é o criminoso unicamente; extirpando-o, extirpa-se a criminalidade. Era mais ou menos isso que as mais de 70 horas de programas policiais bombardeavam a população fortalezense. E estamos em uma guerra... O extermínio da juventude pobre e periférica se abaliza em cada comentário comemorando a morte de “criminosos”, em cada ação de indiferença, a cada normalização desses crimes.

Não esqueceremos; não faremos esquecer:

Antônio Alisson Inácio Cardoso, 17 anos

Jardel Lima dos Santos, de 17 anos

Álef Sousa Cavalcante, de17 anos

Marcelo da Silva Mendes, de 17 anos

Patrício João Pinho Leite, de 16 anos

Jandson Alexandre de Sousa, de 19 anos

Francisco Enildo Pereira Chagas, de 41 anos

Valmir Ferreira da Conceição, de 37 anos

Pedro Alcântara Barroso, de18 anos

Marcelo da Silva Pereira, de 17 anos

Renayson Girão da Silva, de 17 anos

 

Clique aqui e veja documentário do coletivo Nigéria sobre a chacina:

 


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