SAÍ NO MEIO DO FILME!

minions

Por Ângela Pinheiro[1]

Pensava que assistiria um filme leve, alegre, divertido. Levara em conta apenas tratar-se de uma animação, recomendado para qualquer idade, e em exibição em 27 salas de cinema do Estado, em diferentes cidades.

Na sala em que me encontrava, observei, de pronto, crianças de todas as idades, acompanhadas por jovens e adultos, e alguns poderiam ser seus avós. Estávamos em três: uma criança de oito anos, sua mãe e eu.

Logo no início do filme, me percebi surpresa e assustada, com o enredo do filme, que até então desconhecia: seres de eras remotas, denominados Minions, - os protagonistas da película, seguiam um chefe, a qualquer custo.

Chamou-me a atenção também a quase total ausência de risos e gritos espontâneos de crianças e o seu burburinho característico de salas de cinema, durante a exibição de filmes dirigidos a elas. Durante “Minions”, predominava um incômodo silêncio e mesmo indícios das tensões que deveriam estar sendo geradas pelo conteúdo da película em seus expectadores. Raros os momentos de humor descompromissado, como o toque alegre e descontraído da guitarra por um dos personagens, Stuart.

Sem combinação prévia, nós três - A. (a criança), sua mãe e eu, aguardamos um pouco, o que depois viríamos a constatar que assim o fizemos movidas pela esperança de que o desenrolar do filme saísse da sintonia da violência. A. já dava claros sinais de incômodo – não conseguia ficar quieta e segredava algumas vezes com sua mãe. Passados uns quarenta minutos, eis que uma cena de tortura (sim, tortura mesmo, com instrumentos para tal), envolvendo os três protagonistas Minions, foi o sinal inegável e unânime entre nós três que era hora de sair. Para nossa alegria, A. nos disse que já queria ter saído antes, não o fazendo porque fora por mim convidada para irmos ao cinema. Disse-lhe, então, que ficava muito feliz de vê-la não querer assistir a tamanha sucessão de atos violentos.

Fiquei intrigada ainda mais com o filme, ao perguntar a alguns adultos que o tinha visto, entre os quais estão psicólogos, o que dele acharam. Para quedar-me ainda mais intrigada, eles pareciam não ter se dado conta da violência do enredo, até o momento em que sobre ele conversamos. Estaria eu colocando lentes de aumento nas vilanias percebidas, de forma tão predominante e recorrente – recheadas de sentimentos de raiva e de vingança por parte dos personagens, e sendo exigente em demasia? Por certo, também percebi rarefeitas cenas de carinho entre os Minions, bem como de sua tristeza diante da suposta morte de Bob, e de alegria, ao constatar que não era verdade.

Frente a tudo isso, decidi voltar, em outro dia, e ver toda a película, de forma a poder expressar uma opinião mais fundamentada. Previamente, li o resumo anunciado em jornais, que deixa claro, sim, o que poderíamos esperar do filme. Minha preocupação se adensou, pois que o conteúdo se mantinha até o final, e ainda anunciava que haveria uma continuação, sempre com o mote de seguir um chefe a qualquer custo, e de sempre em cega submissão aos seus caprichos e objetivos destrutivos. Até o final, o que sobressaiu para mim foram as artimanhas as mais diversas, para conseguir os objetivos vis dos “Chefes” apresentados, dentre os quais a “Maior Vilã do Universo”, ou algo que o valha.

Fiquei igualmente surpreendida com a naturalização com que cenas de violência integram o filme, como aprendizados escancarados de trapaças e burlas, de traições e malvadezas, tudo pela consecução de objetivos a qualquer preço (e que preço!)

Como compreender também que se libere para crianças – repito, de qualquer faixa etária - enredo de tamanha complexidade? Ademais, para desenvolvê-lo, foram utilizados termos com força agressiva imensurável, tais como: “Isso não é perseguição, é execução” (sic); “Qual devo matar primeiro? Se vocês não aparecerem, eu vou eliminá-los antes do amanhecer” (sic); aliados ao uso de instrumentos como serra elétrica, jatos de fogo, foguetes mortíferos, hipnotizadores, e bananas de dinamite, no meio das quais tremiam personagens “ameaçados de morte”.

A propósito, creio que o filme é não recomendável para qualquer faixa etária,impróprio para quem quer que queira contribuir com a construção de um mundo melhor, com mais delicadeza e humanidade.

 

[1] Professora da UFC, integrante do Núcleo Cearense de Estudos e Pesquisas sobre a Criança (NUCEPEC/UFC). Este endereço de e-mail está protegido contra spambots. Você deve habilitar o JavaScript para visualizá-lo. .

 


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